Cheguei em Amsterdam em 2019, quase 25 anos depois da minha primeira visita e concluí que Amsterdam continua sendo Amsterdam, bárbara, com um sistema de transporte público todo interligado, de fazer inveja a qualquer cidade do mundo.
Entendo que talvez essa seja a primeira resposta para a questão do não uso dos capacetes pelos holandeses; todo o sistema, mesmo que você esteja dirigindo um carro, o caminho será compartilhado com ciclistas. Para se ter uma ideia, quase 30% de todos os deslocamentos são feitos sobre duas rodas (um dos maiores do mundo).
Dessa forma, a consciência adquirida pelo usuário de que qualquer modal de transporte holandês escolhido é que, em algum momento, um ciclista atravessará o seu caminho. Consequentemente, gente mais atenta, menos risco ao ciclista e um ponto a menos ao uso do capacete.
A segunda justificativa vem da experiência que tive ao passar um final de semana na casa de um casal de holandesas que fiz amizade quando pedalava pela Patagônia. Conversando com elas, apontaram-me outro argumento para o não uso: o capacete pode limitar a visão grande angular, assim fornecendo risco à segurança do sistema.
Em Deventer, cidade holandesa onde estive por dois dias, notei que o sistema já possui um alto índice de segurança e confiabilidade, realmente tornando o capacete um acessório inútil. Como é sabido, os holandeses são educados a pedalar a partir dos cinco anos, com aulas teóricas, práticas de sinalização e segurança nas escolas. Os pequenos também incorporam desde cedo regras básicas de sinalização através de cores em inúmeros playgrounds espalhados pela cidade.
Uma outra hipótese pode parecer bizarra, mas foi o que senti quando estive por essas terras baixas. Regras mais rígidas podem ocasionar menos pedaladas. Na Holanda, o ciclismo como meio de transporte está incorporado ao dia a dia da sociedade. Então, uma regra rígida do uso obrigatório poderia gerar cidadãos menos dispostos a tirar a magrela da garagem. Por consequência, menos ciclistas, gerariam mais carros, logo, mais acidentes.
Dessa maneira, concluí que os holandeses estão mais focados em pensar em um sistema como um todo, mais proativo e minimizando riscos, onde todos participam e são responsáveis. Assim, se somos humanos, somos passíveis de erros, dessa forma o sistema está sujeito a falhas e em algum momento elas poderão ocorrer.
O que fazer? Tentar reduzir a zero a falha no sistema. Essa ideia nasceu do programa Visão Zero que foi criado na Suécia em 1997 e foi adotado por diversos países europeus, inclusive a Holanda. Com toda essa estrutura cuidadosamente planejada, chega-se à conclusão que o capacete é apenas uma agulha em um palheiro.
Entretanto, estamos no Brasil, longe da realidade holandesa. Nosso país é gigante comparativamente e temos problemas estruturais em nossas estradas, assim como de educação básica. Nossa cultura da bicicleta como instrumento de mobilidade está engatinhando perto da experiência holandesa. Dessa forma, a utilização do capacete é mais do que uma obrigação nesse momento, é um dever difundirmos o seu uso por muito tempo ainda, com um único objetivo: o de salvar vidas dos inaceitáveis acidentes de trânsito envolvendo ciclistas que presenciamos diariamente.
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